quarta-feira, 6 de setembro de 2023

Por este rio abaixo

 

A arte xávega não é pintura, não é escultura, não é dança, mas implica uma rede de cerco e um saco cónico para capturar o peixe prateado, a partir do engenho do homem e da sua força braçal, com a ajuda dos bois. Pratica-se, ainda hoje, em Portugal, ao longo do litoral norte português.

Em criança, lembro-me dos bois na praia de Vieira de Leiria a puxarem as redes, mas nunca ninguém me explicou que fazia parte de uma arte. Hoje, substituindo os bois, os tratores lá estão, ora puxando ora estendidos na areia, lazeirando quando a faina termina ou, se o mar e a meteorologia o não permitirem. Na segunda quinzena de agosto, não pudemos ver o puxar das redes, “o mar estava bravo”, palavras de pescador, “Só lá para quinta-feira”. (E ainda só era sábado).


Já na Figueira da Foz, mais concretamente na Costa de Lavos, dias antes, a labuta xávega aconteceu.

 


(foto de A.D.)

Em qualquer destas localidades costeiras, o mar, como fruto do rendimento, era complementado com a ajuda da terra. Os pinhais, do outro lado do mar, davam a camarinha, vendida pelas mulheres dos pescadores nas praias, ao jeito de saquinhos de tremoço.  Isto no tempo em que a procura de banhos se torna moda, (e no tempo em que os pinhais não eram devorados pelos incêndios), e estas populações, não enriquecendo com os frutos do mar nem com os da terra, viraram as mãos para a nova galinha dos ovos de ouro, alugando quartos, rooms, zimmers. Hoje, apesar do turismo, Vieira de Leiria continua a ser pobre, quer de vidas quer urbanisticamente.

Mais acima, na zona de Ílhavo, a Praia da Costa Nova, com mar de um lado e rio de outro, teve o engenho e arte de adotar os antigos palheiros para habitações de férias que hoje apetecem e são capa de muitos reels e Instagram de numerosos turistas. Se esta seria e é procurada por famílias da cidade com bolsos de linho branco mais desafogados e agora também pelos turistas, Vieira seria e continua a ser a pátria de gente da Terra, e dos emigrantes que a ela regressam nos meses de verão.


Seja como for, de Ílhavo ou de Vieira de Leiria (Murtosa ou Ovar), muitos pescadores partiram. Durante os meses de Inverno, a partir de meados do século 18, aí vinham eles Rio abaixo, Tejo abaixo, tornando-se nos “nómadas do Rio”, como os batizou Alves Redol.   Instalaram-se em aldeias como Palhota e Escaroupim, no Ribatejo, à procura de outros frutos do mar- o sável e a lampreia substituiriam o carapau e a sardinha. E foi nesses locais que ergueram as suas palafitas, nascendo assim as aldeias avieiras.




Escaroupim ainda lá está, preservando algumas dessas palafitas e reunindo, num pequeno museu, a história do Rio e das suas gentes.







As embarcações lá continuam embaladas pelas ondas do tejo e alguns dos descendentes vieirenses lançaram mão a outras aventuras, rio acima rio abaixo. Falo das visitas guiadas (Rio-a-Dentro), um simpático passeio que varia entre uma e duas horas, contemplando as cores do Tejo, admirando as ilhas da Garça, do Cavalo e ainda as povoações ribeirinhas.




Conselho de autocaravanista: se lá forem no verão, aproveitem para descansar e refrescar na piscina do parque de campismo de Escaroupim, um espaço simples, à espera de renovações e de mais visitantes.





Sem comentários: