quarta-feira, 10 de julho de 2019

Os músicos de Brémen*, sim ou não?





Era uma vez quatro animais já velhos, cansados de serem menosprezados pelos seus donos. Eram eles um burro, um cão, um gato e um galo. A sua revolta era tanta que decidiram fugir. Partiram, com destino a Brémen, para se tornarem músicos na banda da cidade.
Era uma vez uma família, nem nova, nem velha. Os pais e dois filhos, separados por quilómetros, terra e mares. A saudade era tanta que decidiram reunir-se. Só um era músico, os outros ouvintes apaixonados. Partiram, primeiro de Portugal para Amesterdão, depois dali para Groningen e desta para Brémen, ponto de encontro dos quatro.


Os quatro animais não chegaram a Brémen. Os pais e filhos chegaram.
Três deles, ainda com os olhos cheios de tulipas e moinhos holandeses, logo à entrada viram a paisagem repetir-se e pensaram “enganámo-nos”. Afinal constataram que não, a língua era diferente, menos carregada, apesar de igualmente incompreensível, o local chamava-se Mühle am Wall.



Chegado o quarto elemento, o músico (que não era de Brémen, mas que lá chegou), foram-se à Praça Central, onde os quatro animais os esperavam, mesmo não tendo chegado.


O burro era o mais afagado, pois segundo a tradição quem o agarrar pelas patas voltará a Bremen. O burro, o mesmo que não chegou, lá está. Já os pais não voltarão certamente, porque não tocaram no bicho. Os filhos também não lhe tocaram, mas depois daquele dia, em poucas semanas, voltaram a Brémen. Em que fica a tradição? Provavelmente ainda vamos a tempo de afagar o burro e com a ajuda de um escadote talvez o galo que, coitado, não tem culpa de o Criador o ter dotado de asas. Certo é que também não ouvimos a música dos quatro, a não ser, vindos do chão da Praça, zurros, latidos, miados e cacarejos, mediante o envio de uma moeda que se coloca na ranhura de uma tampa de esgoto.



Mas nem só de música se vive em Brémen, sobretudo na Praça Central, onde se ergue um aglomerado de imponentes marcos históricos e arquitetónicos. A estátua de Rolando, símbolo de liberdade para a cidade, foi declarada Património pela Unesco, assim como a Rathaus. Brilham ainda a Catedral, o State Parliament, construção mais atual, de 1966, que contrasta com o peso das pedras e dos séculos dos outros edifícios, mas em simultâneo os reflete nos seus vidros gigantes.














O dia estava soalheiro e silencioso, era sexta-feira de Páscoa e os alemães haviam aproveitado para fugir de Brémen, ao contrário dos músicos que para lá queriam vir. A rua das lojas de artesanato estava praticamente tornada em fantasma e assim o nosso percurso pela famosa Böttcherstrasse não contribuiu para a economia alemã.





Brémen foi terra de pescadores e marinheiros, situa-se no noroeste alemão, e mesmo sem mar, com o rio ali ao lado, o Weser, é uma cidade ribeirinha. Nela se destaca o bairro mais próximo do rio, o Schnoon, com as suas casinhas de rés do chão, dos séc. XV e XVI, onde pescadores e marinheiros residiam. Atualmente são sobretudo galerias de arte e restaurantes, correndo ao longo de ruas estreitas e becos simpáticos.














Fica o casal à espera de lá regressar num dia que não seja festivo, para registar as diferenças e agarrar o burro pelas patas... para furar a tradição.      

 * Conto popular dos Irmãos Grimm

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