segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Irlandas - "sunday , bloody sunday"


Dia 5 (Cong – Donegal – Londonderry / Derry)

Mais um dia que se avizinhava longo de estradas, e o primeiro em solo de uma outra Irlanda, a bem dizer a mesma, mas no entanto regida por outros nomes e outros governos.

Seria dia para furar um pouco o desenho do trajeto e parar em Cong, um pequeno lugarejo por onde havíamos passado na véspera e nos pareceu atraente. E era. Foi cenário de um filme, o antigo “Quiet Man”, com John Wayne e revelava um jardim frondoso, quase bosque, com as ruínas de uma abadia, Cong Abbey, outrora lar agostiniano, fundada por rei irlandês.



Museu de Cong




Cong Abbey


Já quase na fronteira para a Irlanda do Norte (geográfica, porque a física por hora não existe, sabe deus o que ocorrerá depois do Brexit…), pausa para almoço em Donegal. 


 pub - Donegal


castelo de Donegal


Sempre pensei que a cidade fosse maior, na realidade pouco havia para ver, a sua larga praça e o seu castelo. Bisámos a sopa de peixe, e ainda bem que o fizemos, a sua qualidade era muito superior à de Doolin.


Também foi em Donegal que não nos esqueceremos de mais um pequeno episódio relacionado com o carro alugado, o mencionado Adblue. Uma luz acendeu ou acendia desde há muito, e foi em Donegal que decidimos investigar. O sinal de falta de óleo piscava, o livro de instruções sugeria a necessidade de adicionar Adblue, produto desconhecido para os seis portugueses desta comitiva, na realidade trata-se de um fluido adicional para carros diesel. Afinal resolveu-se facilmente, um telefonema para a Europcar que nos aconselhou a comprar o dito, pedir assistência no local, guardar fatura para futuro reembolso. Ainda ficámos um pouco perplexos porque o livro falava que sem o “precioso” líquido, o veículo podia deixar de trabalhar. Na realidade, foi estranho a empresa não ter cuidado devidamente do assunto, antes de nos entregar o carro…

Quando chegámos a Londonderry (nome oficial desde o reinado de James I)/ Derry (nome oriundo de “Doire”, que significa “bosque de carvalhos” e denominação mais vulgar) já nos tínhamos esquecido da questão, era hora de passeio pelas suas ruas quase desertas. Talvez por ser domingo, o certo é que o novo apartamento ficava mesmo no centro, na Shipquay Street, e os poucos transeuntes eram turistas como nós. 



Arquitetura inglesa na Shipquay Street


Circundámos a muralha que rodeia o centro antigo ( ergue-se a uma altura de 8 metros e foi palco do grande cerco de 1689, quando 7000 pessoas morreram de fome e doença).



Do alto do Butcher´s Gate, uma das suas portas, perscrutámos o verdadeiro motivo da visita: o Bogside, ou seja, o bairro católico impregnado de murais alusivos à luta histórica entre católicos e protestantes.



Descemos a rua e no meio da avenida, avistámos o mural que anuncia “Está a entrar na Derry livre”.



Nas vizinhanças, o monumento alusivo ao “Bloody Sunday”, o domingo sangrento de 30 de janeiro de 1972, no qual, nos confrontos entre católicos, protestantes e exército inglês, morreram 14 pessoas (entre eles crianças) e mais de uma vintena sofreu ferimentos. 

Os nomes estão lá gravados, o ambiente em volta nada deixa transparecer, mas no ar paira a sensação que estamos a ser apenas “voyeurs” intrometidos numa luta que ainda dói e que ainda é. A música dos U2 ecoa nos ouvidos, deslizamos incomodados.

I can't believe the news today
Oh, I can't close my eyes
And make it go away
How long?
How long must we sing this song?
How long, how long?
'Cause tonight, we can be as one
Tonight
(…)




Sunday, Bloody Sunday
Sunday, Bloody Sunday
Sunday, Bloody Sunday, Sunday, Bloody Sunday (alright)
And the battle's just begun
There's many lost, but tell me who has won
The trench is dug within our hearts
And mothers, children, brothers, sisters torn apart
(…)



Apesar da dor, ou por causa dela, apesar da recente liberdade, ou falta dela, o ambiente da cidade à noite era estranho. Magotes de gente do outro lado da ponte, numa área apelidada de Ebrington, em tudo com ar de ter sido zona de fábricas e estar agora a ser modernizada. 



Realizava-se um festival de música, e nas redondezas, adolescentes, homens e mulheres, desde os 20 aos 60, entornavam álcool e caminhavam meio embriagados, gritando e expandindo os corpos, invariavelmente pesados e gordos.
A festa ouviu-se pela noite dentro, quem tinha vidros duplos conseguiu dormir. Era noite de domingo em Derry, mas não eram os U2 a cantar.


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